quarta-feira, 13 de abril de 2011

BONDE DO TIGRÃO

BONDE DO TIGRÃO

O TEXTO ABAIXO É DO ADVOGADO E EX-DEPUTADO FEDERAL VICENTE CACCIONE QUE USANDO A IRONIA, MOSTRA O ESGOTO ABERTO QUE É A MÚSICA DESTA GERAÇÃO FUNKEIRA. (Pelo Historiador Valdemir Mota de Menezes)

O martelo do Tigrão
Vive-se um período de fartura intelectual. Jamais tantos se inspiraram tanto
na arte de compor músicas e escrever versos.
Convenço-me de que os tempos hoje são outros. Há mais sensibilidade e,
portanto, mais arrepio à flor da pele quando se ouve, digamos, as canções
atuais, e constato o absurdo dos saudosistas que ainda teimam em considerar
poeta o velho Orestes Barbosa só porque rabiscou essa estrofe de
“chão de Estrelas”: A porta do barraco era sem trinco, e a lua furando nosso
zinco salpicava de estrelas nosso chão. Tu pisavas nos astros distraída,
sem saber que a ventura desta vida é a cabrocha, o luar e o violão.

Como outro exemplo de banalidade poética, que encantou os idiotas de
minha geração, lembro-me dos versos de Dolores Duran, em sua “Noite do
Meu Bem” : Hoje eu quero paz de criança dormindo, e abandono de flores
se abrindo, para enfeitar a noite do meu bem...

Hoje os tempos são outros. É preciso guardar no fundo do baú algumas
pieguices como a “Disparada”, de Geraldo Vandré, o “Pedro Pedreiro”,
do Chico Buarque, algumas cafonices de Roberto e Erasmo, e sandices
paridas por Caymi e outros impostores de sua geração, cuja mediocridade
conseguiu consagrar Ary Barroso e sua lastimável “ Aquarela do Brasil”.

Hoje os tempos são outros. As rimas são ricas, o conteúdo das letras é
profundo e as melodias transformam em entulho toda a criação do bisonho
Antonio Carlos Jobim.

Hoje os tempos são outros. Toda a inspiração e a sensibilidade que faltou
aos compositores da antiga, do imenso deserto de sua herança indigente
de músicas e versos, brota o lirismo que recomenda as popozudas que
cada qual empine a sua bunda, na coreografia das bundinhas que sobem
e descem devagarinho, afinal tá tudo dominado. Vem o arrepio de emoção
quando o poeta desfere o tapinha que não dói, dado nas glamourosas que
ficam maluquinhas, ou quando desponta o gesto carinhoso do romântico
Tigrão que vai passar cerol na mão, aparar a amada pela rabiola para joga-la
na cama e botar muita pressão, martelando com o martelão, e já se vê
que o martelo sai das oficinas para a sublimação da meiguice absoluta.

Bem-aventurados os jovens contemporâneos que podem embalar-se ao
som dessas músicas. Elas são a expressão mais viva da sensibilidade humana
e, não é por acaso, que essa arte veio para ficar e nos despertar de
toda aquela babaquice que nos enchia alma de ternura, punha lágrimas
nos olhos dos otários, fazia suspirar os tolos corações dos românticos que
sonhavam com bobagens e se emocionavam com o encanto de um olhar
ou com a ternura de mãos se encontrando.
Hoje os tempos são outros. Temos a garrafa e o martelo, a inspirar aquela
moça sensível pedindo que a chamem de “cachorra”.

Infelizmente não são todos os que se converteram aos encantos da nova
arte. Muitos idiotas ainda insistem em escrever cartas de amor, ler poemas
de Vinícius, crônicas de Rubem Braga, mandar flores às pessoas amadas,
teimam em ouvir canções cheias de pieguice, sentem emoções que não
dependem dos movimentos ginecológicos dos cantores dos novos tempos,
e choram, e se arrepiam e se comovem diante das palavras e músicas
onde não há espaço para martelos, garrafadas e cachorradas, e não se
deixaram dominar por tudo quanto tá inexoravelmente dominado.


A Tribuna. 4/3/2001, p.A3.







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